Carta do coronavírus

Publicado da edição 420 do Jornal do Sol

Pensei muito nestes dias, sobretudo para dar um sentido à situação absurda em que nos encontramos. Deve ter um sentido e eu imaginei o que o vírus diria numa carta, caso pudesse escrevê-la.  Ei-la:

“Pois bem, estou aqui e escrevo porque estou cansado de ver que vocês ficam regredindo, sem crescer. Cansado de ver como estão tratando o nosso planeta, os outros. Cansado das violências, das guerras, dos prejuízos, da inveja, a hipocrisia, o egoísmo causados do pouco tempo que vocês dedicam à família, aos filhos. Cansado dos equívocos da vossa vida que valoriza mais o supérfluo que o essencial, a roupa mais bela, o celular, o carro, as traições, a falta de informação, o pouco tempo para se comunicar.

Estou cansado das lamúrias, queixas, brigas, críticas contra os governantes, enquanto não fazem nada para melhorar. Estou cansado de ver pessoas que se ofendem e até matam por causa de um jogo de futebol. Talvez estou sendo duro demais, mas não me importo, sou apenas um vírus... ceifarei vidas, mas vocês têm que entender que é preciso mudar de rumo.

Quero vos deixar uma mensagem simples: falo dos absurdos limites em que se meteu a sociedade para que entendam que é preciso eliminá-los e se preocupar com a vida... Quis que vocês ficassem isolados nas vossas casas, separados dos filhos, dos pais, dos avós... Para que entendessem quanto é importante um abraço, um beijo, o contato humano, uma tarde com os amigos, um passeio no centro, na praia, num parque, o jantar com os amigos. Destas coisas deve repartir tudo de novo, sem fazer distinções.

Eu provei que as distâncias não existem, andei quilômetros e quilômetros e vocês nem perceberam. Eu estou de passagem, mas os ensinamentos e sentimentos que expressei devem durar para sempre. Vivam a vossa vida o mais simples possível, caminhem, descansem, façam exercícios. Façam o bem pois ele vai voltar com os juros.”

Danilo Calabrese

 

“Peguei esta ‘carta’ do celular de amigos italianos. Improvisei esta tradução livre, espero que o autor, que não conheço, não me denuncie pela quebra dos direitos autorais (rssss).  Acredito que esta reflexão faz parte dos direitos humanos que, embora esquecidos, devem voltar a vigorar o mais rápido possível, pois são a única garantia da sobrevivência humana na Terra.

A falta de máscaras, ventiladores e vacinas pode ser resolvida, mas os aumentos dos famintos e a justa revolta deles não será resolvida até que não seja debelada a injusta repartição dos bens.

A gente se queixa: ‘puxa, este vírus..., que estrago está fazendo’! Será que estes estragos custam menos ou mais do que as armas e as guerras? Ninguém pediu para nascer mas, uma vez que se encontra nesta terra, tem direito à vida digna. Mas existem mais de um bilhão de pessoas sem teto, sem a comida necessária, sem saúde...”


Antônio Tamarri é professor de História e Teologia