Estudo regional mostra fatores que levam à violência com crianças

Um estudo realizado por professores e estudantes da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) teve seus resultados divulgados na revista Psicologia.PT. O artigo Violências contra crianças e adolescentes em Porto Seguro, Bahia: um estudo exploratório documental junto ao Conselho Tutelar II é assinado por Émerson da Silva Mendes, Emily Stephanie Morais dos Santos, Monalisa Pereira Santos, Rayssa Souza, Cristiano da Silveira Longo e Stella Narita.

O trabalho apresenta a análise dos dados obtidos durante a realização do projeto de pesquisa intitulado Violência Física e Psicológica contra crianças e adolescentes no município de Porto Seguro, no extremo sul da Bahia: retrato após a "Lei Menino Bernardo" na cultura da violência doméstica local, apoiado com bolsa pelo Programa de Iniciação à Pesquisa, Criação e Inovação (PIPCI) da Universidade Federal do Sul da Bahia. O projeto foi tema de uma das primeiras notícias da editoria UFSB Ciência, lançada em março de 2019.

Com o trabalho junto aos registros de casos do Conselho Tutelar II de Porto Seguro, equipe caracterizou os tipos de violência contra crianças e adolescentes; Émerson avalia que as instituições de proteção e prevenção devem ser fortalecidas. O trabalho desenvolvido tratou dos dados das notificações ao Conselho Tutelar II do Município de Porto Seguro em 2015 e mapeou os casos de violência por identificação dos perfis das vítimas e dos(as) agressores(as), os tipos de violência, a cronicidade, os efeitos sobre a saúde corporal e psicológica da vítima, as motivações para os atos violentos e as medidas sociojurídicas aplicadas.

Combinando a investigação documental analítico dos casos notificados ao Conselho Tutelar II com a Análise de Conteúdo, a equipe processou 331 casos a partir de um recorte inicial de 404. Com isso, chegou-se a evidências de que a violência contra crianças e adolescentes, dentro e fora de casa, é um fato que ocorre em todas as camadas sociais e que é preciso fortalecer as ações de prevenção de novos casos e de proteção social para as vítimas.

O tema mostra também a necessidade de mudança dos parâmetros do que se considera como boa prática educativa. Como os autores mostram, apesar do assunto ter desenvolvimento recente, as raízes da condução pedagógica violenta são antigas e atravessam os sedimentos culturais. Um dos coordenadores do projeto, professor Cristiano Longo, explica que a pesquisa foi formalmente finalizada, e possíveis próximas etapas consistem no processo de divulgação científica (publicação de artigos e submissão de trabalhos sobre a pesquisa para participação em eventos científicos). O professor Cristiano, Émerson e a professora Stella falam mais sobre o resultado do projeto em entrevista por e-mail para a UFSB Ciência.

O artigo aponta para os fatores históricos e culturais que embasam a ideia de que a palmada educa, de que os castigos corporais são elementos necessários para bem educar os filhos; apresenta ainda os fatores históricos e culturais favoráveis à punição corporal de crianças e adolescentes, tecendo críticas a tais construções. Como efeitos sociais temos a própria naturalização e banalização da violência, a internalização da violência física como resolução de conflitos interpessoais, o aumento dos índices de violência doméstica contra crianças e adolescentes, e, por fim, a crença de que "bater educa". O sofrimento físico, psicológico e comunitário desencadeados por práticas disciplinadoras violentas deixa profundas marcas no tecido social.

Como se tratam de casos que chegaram ao Conselho Tutelar e, de modo geral, as classes socioeconômicas menos favorecidas são as que mais recorrem a este órgão, a pesquisa em questão traz, em sua grande maioria, casos de crianças e adolescentes oriundos de tais classes. Nesse sentido, tratam-se de crianças e adolescentes vítimas, de famílias com baixa renda. Entretanto a literatura científica aponta que a violência doméstica contra crianças e adolescentes (física, psicológica, sexual, fatal ou negligência) está presente em todas as classes sociais, sendo portanto um fenômeno "democrático", isto é, atinge a todos, estando presente em todas as famílias.


Fonte: Ascom UFSB