Moda e política combinam?

Publicado da edição 425 do Jornal do Sol

Num primeiro momento, analisando superficialmente o questionamento que traz o título dessa coluna, pode realmente parecer que são assuntos que definitivamente não têm relação alguma. Contudo, pasmem: os dois temas estão intimamente ligados e eu posso provar! A moda, em um significado mais amplo e abrangente, tem o poder de representar ideias, movimentos ou causas, e trazer à luz uma série de questões da sociedade. Através da sua roupa você pode expressar um sentimento ou pensamento, mas também seu posicionamento com relação a um determinado assunto. Mas como seria isso?

Vamos de alguns exemplos: na época da ditadura militar no Brasil, despontou nacional e internacionalmente a estilista Zuzu Angel. Ficou bastante conhecida pelo seu trabalho inovador, mas sobretudo, porque usou de sua arte como forma de protesto e denúncia, quando teve seu filho Stuart Angel assassinado pelo governo. Um pouquinho atrás, logo após a II Guerra Mundial, observamos Cristian Dior com seu “new look”, que nada mais era que uma forma de trazer leveza e esperança para uma época tão castigada pela sequência das grandes guerras.

Voltando aos dias atuais, temos alguns nomes da moda nacional com um trabalho expressivo no quesito representatividade. Posso citar, sem medo algum de errar, o estilista mineiro Ronaldo Fraga. Ronaldo traz na sua arte a singularidade do povo brasileiro, em criações que representam como ninguém a nossa cultura. Além de ser uma cabeça pensante e contestadora ferrenha do atual governo nacional. Mais uma vez, vemos aí a moda sendo usada como ato político. É de suma importância termos instrumentos capazes de traduzir ao mundo nossas ideias e questionamentos, e a moda pode e deve ser usada como uma dessas poderosas ferramentas de expressão.

Não devemos enxergar o mercado da moda apenas como meio de consumo desorganizado e sim com uma potente arma para a mudança de diretrizes de comportamento. Através dela podemos desenhar e criar um mercado mais criativo, sustentável e com as relações de trabalho e com a natureza muito bem definidas. O lucro pelo lucro deve ser revisto urgentemente, uma vez que só acarreta danos para esse nicho, seja no superfaturamento de peças, cópias mal feitas ou na relação de trabalho análoga à escravidão. Parece exagero? Mas não é, e tivemos recentemente no Brasil denúncias que envolviam grandes marcas em escândalos dessa natureza.

Acredito que deu para esclarecer um pouco sobre o assunto, que é extenso, e mostrar que moda é sim um ato político e como tal deve ser tratada com toda a seriedade que o assunto merece, uma vez que impacta diretamente na economia e consequentemente na sociedade. Fiquem atentos na hora de consumir moda, procurem saber um pouco mais sobre a marca que está comprando, qual o papel desenvolvido por ela e acima de tudo, se ao usar essa marca você estará compactuado com os mesmos valores e princípios. 


Mariana Guerra é empresaria e consultora de imagem