Oficiais de justiça reclamam da falta de segurança para cumprir mandados

Além de auxiliar o juiz em audiências e julgamentos, os oficiais de justiça, servidores do Poder Judiciário, são incumbidos de cumprir decisões judiciais, que podem ser uma simples citação ou intimação, um mandado de prisão, de busca e apreensão de uma criança, desocupação de um imóvel, ou ainda de afastamento de um marido agressor. Em Porto Seguro, oficiais de justiça se queixam de más condições de trabalho, especialmente da falta de segurança e da dificuldade para encontrar os domicílios a que são destinados a comunicação.

Para chamar atenção das autoridades para o assunto, junto com colegas de profissão, a oficial de justiça Shirley Barrack preparou um documentário com texto e fotografias, narrando o cotidiano desses profissionais a serviço da Justiça. Em carta intitulada “O papel do oficial, do ponto de vista extraoficial”, Shirley critica o fato de que a grande extensão da comarca de Porto Seguro esteja a cargo de 17 oficiais de justiça, “protegidos apenas pela camisa de algodão”, buscando cumprir mandados da Justiça Comum e do Sistema dos Juizados Especiais.

“São 2.287 km2 de município, com seus inúmeros e populosos bairros. Só o Baianão tem cerca de 70 mil habitantes e tem ainda os distritos de Vera Cruz, Arraial d’Ajuda, Vale Verde, Trancoso, Caraíva, Aldeia de Barra Velha, Queimados, Boca da Mata etc; alguns paradisíacos, mas com muitas estradas sem pavimentação.”

Ela critica o fato de a “terra-mãe, a caminho dos 519 anos”, não sinalizar grande parte dos logradouros, muitos deles sem localização via no satélite (GPS). “A rara numeração das casas afronta os conhecimentos mais elementares da matemática, pois os números são repetidos e sem sequência lógica”, observa. Segundo a oficial, a população flutuante e desconhecida entre si, típica de cidade turística, torna o trabalho do oficial ainda mais desgastante e infrutífero.

Shirley cita a necessidade do surgimento de “super-oficial”, enfrentando limites e, em alguns casos, assumindo as despesas para executar suas tarefas. Para levar mandados a Barra Velha, por exemplo, “o oficial precisa atravessar de balsa para o Arraial d’Ajuda, viajar durante uma hora até Trancoso e percorrer até Caraíva mais 37 km de estrada de chão, em severas condições, em seu veículo particular e inadequado para o trecho”. Segundo ela, a indenização de transporte fornecida pelo TJ é de apenas R$ 13,07 por mandado.

Ao deixar o veículo às margens do Rio Caraíva, pagam estacionamento, canoa, para atravessar e mais R$ 80 pela viagem de buggy até Barra Velha. “São só 6 km, que duram uma eternidade porque não há estrada, mas um autêntico areal. De lancha sai a 75,00 por pessoa e depende de lotação.”

Risco de vida

Mas a falta de segurança é, sem dúvida, o fator que mais pesa no trabalho dos oficiais. E, segundo Shirley, interfere negativamente no resultado. “Em Caraíva, comunidade com apenas 1000 habitantes, localizada dentro da área de proteção ambiental não havia nenhum militar no posto policial. “A expectativa da comunidade é que a justiça se efetive! E a terra-mãe tem que dar exemplo pro resto do país! Esse oficialato não pode, definitivamente, ser encarado como uma mera relação de trabalho, pra isso já existe o carteiro!”, ressalta.

Os problemas são registrados por servidores de todo o Estado. Dados Sindicato dos Oficiais de Justiça da Bahia (Sindojus) informam que, em 2018, 14 oficiais de justiça na Bahia registraram situação de violência em serviço, muitos deles, mais de uma vez. As ameaças partiram, segundo o sindicato, de pessoas intimadas ou seus familiares, traficantes e até sem-terra. “Fui intimidado pelo réu portando uma pistola à mostra e estava nervoso, me deixando com medo do pior”, disse um oficial que não quis se identificar. Outro oficial afirmou que foi ameaçado, mesmo em companhia da polícia: “ao intimar um agressor de violência doméstica, ele saiu com uma faca na mão. E eu estava com a polícia.” E outro oficial afirmou que foi salvo por um mototaxi que acompanhava a diligência.

De acordo com Itailson Farias da Paixão, presidente do Sindojus, os oficiais de justiça ficam, em grande parte do tempo, vulneráveis. “Quando a gente vai cumprir um mandado mais complexo, uma busca e apreensão de uma criança, um afastamento do lar, uma prisão, a gente já sabe que vai ser necessário usar a força e aí o juiz acaba determinando que a gente vá com a polícia. O resto, a gente vai sempre contar com a sorte”, disse Itailson, citando encontros com pessoas emocionalmente desequilibradas e abordagens feitas por traficantes.

O presidente do sindicato dos oficiais de justiça afirma que, há, desde o dia primeiro de junho de 2016 um processo no Tribunal de Justiça da Bahia referente às normas de segurança, mas ainda sem decisão. “A sensação de impunidade é muito grande nesse país. Nossa situação é extremamente complicada. O TJ sempre alega falta de condições financeiras. A gente pede qualificação na defesa pessoal, por exemplo, e o tribunal diz sempre que não tem condições. Temos uma missão que é nobre, extremamente importante para a sociedade, mas que não conta com estrutura para cumprir nosso papel”, desabafa.

TJ/BA afirma que está buscando valorização dos oficiais de Justiça

Por meio de sua assessoria de Comunicação, o TJ/BA afirmou que tem intensificado um trabalho de valorização do servidor com o acompanhamento de todos os sindicatos representativos inclusive o Sindojus/Bahia. “Já está em fase de conclusão e finalização uma campanha para valorização do oficial de justiça com o fortalecimento do papel desempenhado e do conhecimento adquirido”.

Segundo o TJ, no início de novembro, foi realizado, em feira de Santana, o 1º Seminário de Atualização Legislativa e Procedimental para Oficiais de Justiça. O evento contou com a participação do juiz de Direito Antonio Henrique da Silva, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Feira de Santana e Coordenador do Comitê Local da Governança da Política de Gestão de Pessoas do TJ/BA; do diretor do Fórum Des. Filinto Bastos, em Feira de Santana, Dr. Antonio Gomes de Oliveira Neto; do Sindicado dos Oficiais de Justiça do Estado da Bahia - Sindojus/BA, através do seu Presidente, Itailson Farias da Paixão, do Comitê Local da Governança da Política de Gestão de Pessoas do TJ/BA; da Unicorp e do TJ/BA.

Dentre outros assuntos, esteve na pauta a atualização legislativa referente à Lei de Organização Judiciária do Estado da Bahia, Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), Processo Civil, Penal e Administrativo, Fazenda Pública, Procedimentos administrativos e correicionais e ferramentas tecnológicas.